QUANTO MENOR, MELHOR?

Escrito por: Helene De Vos.
A RESCALED apoia a utilização de casas de detenção em pequena escala em vez de grandes estabelecimentos prisionais. Para tornar este apelo concreto, ‘pequena escala’ é definida como um máximo de 30 pessoas por instalação. Isto baseia-se em investigações e práticas internacionais, que mostram que esta escala facilita as interações pessoais bem como, a comunicação direta, o que reduz a burocracia e procedimentos, comparativamente a instituições grandes. Mas porquê um máximo de 30?
Menos do que 50 lugares
Há mais de dez anos, uma equipa de investigadores noruegueses avaliou a qualidade de vida em todas as 32 prisões fechadas da Noruega. Descobriram que a qualidade de vida era significativamente maior em prisões com capacidade inferior a 50 lugares (Johnsen, Granheim & Helgesen, 2011; Johnsen & Granheim, 2012). Nestas pequenas prisões, as pessoas privadas de liberdade avaliaram as suas relações com o pessoal, o tratamento geral e o seu bem-estar de forma mais positiva do que aquelas em prisões maiores. Curiosamente, estas experiências positivas também se aplicaram aos membros da equipa de staff, tanto nas suas interações com as pessoas como com a gestão sénior. Estas descobertas estão em linha com outras investigações internacionais e sugerem que as instalações prisionais com capacidade inferior a 50 têm um melhor desempenho nas áreas que realmente importam para as pessoas envolvidas.
No entanto, por muito interessantes que estas descobertas sejam, elas contam apenas parte da história. Seria demasiado simplista concluir que todas as prisões com capacidade inferior a 50 lugares têm melhor desempenho do que as prisões maiores. Uma observação importante é que quase todas as prisões em pequena escala nesta investigação norueguesa tinham uma capacidade muito inferior a 50, com uma média de cerca de 25 lugares por prisão. Esta observação também foi feita por arquitetos que visitaram instalações prisionais de pequena escala para vários projetos de investigação, como Sabrina Puddu (Universidade de Cambridge e Universidade de Artes de Londres) e Matt Dwyer (Local time). Mesmo que tenham visitado instalações muito diferentes em países diferentes e para projetos distintos, receberam respostas semelhantes à pergunta sobre o número ideal de pessoas por instalação: entre 8 e 24-25.
O significado dos números
Então, e uma capacidade de 7, 26 ou 49? Este número importa realmente? Importa mais do que se possa pensar, num primeiro momento. Como confirmado pela pesquisa norueguesa, os benefícios das instalações de pequena escala estão relacionados com a qualidade das relações entre as pessoas privadas de liberdade, os membros da equipa de staff e a gestão, e mais especificamente com a natureza da comunicação, sensação de envolvimento, sentido de justiça e respeito. Dada a importância das relações ou interações sociais, a escala não deve ser medida pelo número de pessoas, mas pelo número de relações individuais ou interações sociais entre essas pessoas. Por exemplo, num grupo de 4 indivíduos (pessoa A, B, C, D), existem seis interações possíveis entre eles (A com B, A com C, A com D, B com C, B com D, C com D)[1]. Com cada pessoa adicional, este número de relações aumenta exponencialmente. Num grupo de 24 pessoas, existem 276 relações individuais possíveis e num grupo de 30 pessoas, isso torna-se 435. Ao considerar uma prisão ou casa de detenção com capacidade para 24 ou 30 pessoas privadas de liberdade, estamos a falar mais de grupos de 48 ou 60 pessoas (com uma proporção de pessoal-residente de 1:1), e o número de relações entre eles aumentará de acordo. Ao olhar para esses números, é muito mais fácil entender por que se torna desafiante ou impossível conhecer realmente cada pessoa individualmente numa instalação com mais de 24 ou 25 pessoas privadas de liberdade.
Pelos mesmos motivos, também há um número mínimo de pessoas necessário para criar o número mínimo de interações necessárias para uma dinâmica de grupo saudável. Quando Matt Dwyer visitou instalações para jovens, concluiu que esse mínimo é 8. A dinâmica de grupo desejada dificilmente surgiria em grupos com menos de 8 jovens. Sabrina Puddu também foi informada de que o mínimo é 8, uma vez que um grupo mais pequeno não permite variedade suficiente nas interações sociais, o que pode resultar facilmente em relações tóxicas e conflitos. Experiências semelhantes com climas sociais tensos foram relatadas na Noruega, no contexto das prisões locais muito pequenas que alojavam apenas 4 ou 5 pessoas (mas que foram encerradas há muito tempo).
O valor das relações construtivas
Claro, nada disto se resume a números. É sobre pessoas. O pequeno número apenas ajuda a moldar dinâmicas de grupo construtivas e relações interpessoais, que são valiosas por várias razões. Primeiro, quando as pessoas detidas experienciam as relações numa instalação de forma mais positiva, os níveis de bem-estar geral tendem a aumentar, enquanto os níveis de violência, desordem e auto-mutilação diminuem (Auty & Liebling, 2020; Johnsen et al. 2011; Liebling, 2004; 2011). Além disso, os sentimentos de segurança aumentam para a maioria das pessoas privadas de liberdade quando o pessoal é visível e acessível, e os incidentes podem ser prevenidos ou resolvidos mais facilmente (Crewe, Liebling & Hulley, 2014). Em segundo lugar, uma maior qualidade de vida percebida durante a privação de liberdade tem sido associada a uma redução da reincidência após a libertação (Auty & Liebling, 2020). Em terceiro lugar, a maior satisfação no trabalho relatada pelos membros da equipa de primeira linha em prisões mais pequenas também leva a menos baixas por doença e, eventualmente, a custos reduzidos (Johnsen et al., 2011). Finalmente, a pequena escala contribui também para melhores relações com pessoas de fora das instalações, uma vez que tais instalações têm maior probabilidade de estar localizadas em bairros de fácil acesso ao pessoal, ONGs e visitantes (Johnsen & Granheim, 2012), e porque instalações de pequena escala tendem a ser mais amigáveis para visitantes do que grandes instituições prisionais, o que é particularmente relevante quando os visitantes são crianças.
Com base em tudo o que foi exposto acima, é claro que a escala das instalações de detenção desempenha um importante papel facilitador na criação de um ecossistema construtivo, devendo, portanto, ser limitada a 30 pessoas por instalação, e mais corretamente a 8 a 25 pessoas. Ao mesmo tempo, no entanto, deve também ficar claro que a escala é apenas um facilitador e não uma solução em si mesma. É necessário mais, mas a redução da escala é um primeiro passo valioso.
Agradecimentos: Devo muitos agradecimentos a Matt Dwyer e Sabrina Puddu por partilharem comigo as suas perspetivas e descobertas de investigação, que são muito mais relevantes e detalhadas do que as apresentadas neste texto do blog.
[1] Este raciocínio foi-me transmitido por Matt Dwyer.
Fotografia via: Wish Eu.

Helene De Vos
Helene De Vos é Diretora Executiva da RESCALED,
Criminóloga e Investigadora
no Leuven Institute of Criminology (KU Leuven).
Texto Original (EN)
https://www.wish-eu.eu/differentiation/
Tradução por: Rute Coimbra Dionísio (Voluntária RESHAPE).
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